terça-feira, 31 de dezembro de 2013

ANO VELHO, ANO NOVO




Soa o sinal: são doze badaladas.
Partiu o Ano Velho e veio o Novo,
Sobe-se uma cadeira ou as escadas
E queima-se foguetes para o povo.

Mais um que passo… e sempre me renovo,
Pelo menos, na fé que essas entradas
Me tragam melhor vida e me comovo
Da sorte das pessoas mal fadadas.

Neste virar de folha ao calendário,
Não posso me queixar do meu fadário,
Pese embora diversos desenganos.

E mais uma vez… pouco é o que peço:
Saúde e amor, dinheiro que mereço
E possa isto pedir… por muitos anos.



Tito Olívio

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

NATAL




Não ouço, daqui, o repicar dos sinos,
nem os coros de natal, nem, sequer,
o alvoroço, que o meu riso de criança
transportava. Eu sei : a infância
perdeu-se no lugar onde nasci.
Contudo, a um canto da memória,
está, ainda, resistindo ao sono,
a menina que fui. E, ano após ano,
aguardo, com ela, um menino jesus,
para sempre adormecido no meu peito.


Graça Pires,
De Quando as estevas entraram no poema, 2005

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

NATAL







O natal serão perus recheados
ou a nostalgia de uma neve
longínqua que nossos pés nunca tocaram?
Serão presentes embrulhados
em papel azul
e a alegria com hora marcada?
Serão famílias bucolicamente
sorridentes com seus corações
de lava fria?
Os pés de um homem tocaram
a terra para mudar a Terra
e deixaram um rastro de amor
e sangue.
Seu nome é mistério e senha.
Por que o homem precisa da desculpa
de um outro homem
para mergulhar as mãos no mel
e no horror?
penso nas mulheres queimadas
em seu nome, amém.
Penso nas guerras, conquistas, mentiras,
intrigas, em seu nome, amém,
quando o seu maior milagre
foi equilibrar-se na superfície
escorregadia dos sonhos.

Roseana Murray,
in O Silêncio dos Descobrimentos



sábado, 21 de dezembro de 2013

NATAL, E NÃO DEZEMBRO



Entremos, apressados, friorentos,
numa gruta, no bojo de um navio,
num presépio, num prédio, num presídio,
no prédio que amanhã for demolido…

Entremos, inseguros, mas entremos.
Entremos, e depressa, em qualquer sítio,
porque esta noite chama-se Dezembro,
porque sofremos, porque temos frio.

Entremos, dois a dois: somos duzentos,
duzentos mil, doze milhões de nada.
Procuremos o rastro de uma casa,
a cave, a gruta, o sulco de uma nave…
Entremos, despojados, mas entremos.
Das mãos dadas talvez o fogo nasça,
talvez seja Natal e não Dezembro,
talvez universal a consoada.


David Mourão Ferreira ,
in Cancioneiro de Natal.

domingo, 15 de dezembro de 2013

CITAÇÕES DE NELSON MANDELA



"Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele,
por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar,
as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar,
podem ser ensinadas a amar."

"Eu sou o capitão da minha alma."


"Nascemos para manifestar
a glória do Universo que está dentro de nós.
Não está apenas em um de nós: está em todos nós.
E conforme deixamos nossa própria luz brilhar,
inconscientemente damos às outras pessoas
permissão para fazer o mesmo.
E conforme nos libertamos do nosso medo,
nossa presença, automaticamente, libera os outros."


Devemos promover a coragem onde há medo ,
promover o acordo onde existe conflito, e inspirar
esperança onde há desespero.

(em seu aniversário de 89 anos)


"Eu me retiro com a consciência tranquila,
sentindo que cumpri meu dever, de alguma forma,
com meu povo e meu país"

"A morte é inevitável. Quando um homem fez o que
considera seu dever para com seu povo e seu país,
pode descansar em paz."

"Eu lutei contra a dominação branca, e eu lutei contra a
dominação negra. Eu nutri o ideal de uma sociedade democrática
e livre, na qual todas as pessoas vivem juntas em harmonia e
com oportunidades iguais. É um ideal que espero viver para
alcançar. Mas, se for preciso, é um ideal pelo qual estou
preparado para morrer"

Nelson Mandela

SEMEADOR



Em amoroso gesto,
espargiu sementes
no espaço

nasceram luzes
e floresceram estrelas...

A nós delegou
o privilégio da colheita


Adélia Wollner

O TEATRO DAS CIDADES



Qualquer tempo é um tempo duvidoso
assim o meu cercado de cidades
plataformas instáveis
praticáveis cobertos de infinita gente náufraga
que se inclina nas águas como um palco

Paro na convergência dos estrados
chove já sobre a raça ameaçada
Incertas multidões em volta passam
contemporâneas falam interpretam
a duvidosa língua das imagens

Assim no teatro abstracto das cidades
morrem palavras sobre um palco náufrago

O tempo cobre o céu que se enche de água

Gastão Cruz
in O Pianista

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

NELSON MANDELA



“Há pouca coisa favorável para se dizer a respeito da pobreza,
mas muitas vezes ela serve para incubar uma verdadeira amizade.
Muita gente faz amizade connosco quando somos ricos, mas são
muito poucos e preciosos os que se tornam nossos amigos quando
somos pobres. Se a riqueza é um ímã, a pobreza é uma espécie
de repelente. Mesmo assim a pobreza costuma revelar a verdadeira
generosidade nos outros.”

Nelson Mandela,
in "Longo Caminho para a Liberdade"

domingo, 8 de dezembro de 2013

O NASCIMENTO DA TERCEIRA IDADE



Eis que na maresia do vento
Caíram imagens, espessos subterfúgios
E sombras ociosas ostentando
Intenções de alívio em demasia.
Eis que na viagem dos vazios comprometidos
Nasceram aflitos intervalos no peso do conjunto
Processando a deterioração dos limites,
Levando o raciocínio à região do irreal,
Tomando dimensões tão prolongadas
Como oceanos afogando a margem
Dos desígnios superpostos do passado.
Eis que dormidos no sono igualitário
Do sonho por nascer ou já exumado
O vulto cresce no ser inacabado
Que a insônia transforma em terceira metade assustada
E avança nas bordas do externo da unidade
Como personagem ameaçada.
Eis quando o apelo de frio vento
Saído de moléculas falecidas
Cobre o infinito em mutações,
Mostra-se no implacável transitório,
E como flor
Retorna à sucção dos elementos
Fecundando repetidas e silentes emoções.

Adalgisa Nery
In Erosão (1973)

sábado, 7 de dezembro de 2013

O MEU PRIMEIRO LIVRO



Não me lembro da cor dos meus olhos,
quando, em menina, me comovia
com heróis imaginários.
Mas, recordo-me bem, eu fui a princesa
do conto de fadas da minha infância.
Do âmago da emoção a contemplo,
prisioneira do mesmo luar
que me protegia da noite. Sobre isto, não há lugar
para explicações metafísicas. Tudo se esgotava naquele
mundo encantado de palavras, que me apagavam do olhar
todas as sombras. Depois, perdi a inocência, por descuido,
e deixei de ser princesa.
Blondina era o seu nome.

Graça Pires
De Reino da lua, 2002

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

HÁ UM HOMEM À ENTRADA DOS MEUS SONHOS




Desato o sono e sento-me numa pedra, mais perto de mim.
E vi-o de novo.
Tão sereno como uma vereda para a nascente.
Digo, então, que há um homem à entrada dos meus sonhos.
Traz, nas mãos, promessas de trigo
e, no olhar, a alegria, presa por um fio.
Espanta-me a facilidade com que chora.
Deve ser por isso que existe um rio na minha insónia
e não posso ignorar a limpidez dos seus olhos.

Graça Pires
De Outono: lugar frágil, 1994

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

O MARTELO



As rodas rangem na curva dos trilhos
Inexoravelmente.
Mas eu salvei do meu naufrágio
Os elementos mais cotidianos.
O meu quarto resume o passado
em todas as casas que habitei.
Dentro da noite
No cerne duro da cidade
Me sinto protegido.
Do jardim do convento
Vem o pio da coruja.
Doce como arrulho de pomba.
Sei que amanhã quando acordar
Ouvirei o martelo do ferreiro
Bater corajoso o seu cântico de certezas.


Manuel Bandeira,
in Estrela da vida inteira.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

MANOEL DE BARROS


"Acho que o quintal onde a gente brincou é maior do que a cidade.
A gente só descobre isso depois de grande. A gente descobre que
o tamanho das coisas há que ser medido pela intimidade que temos
com as coisas. Há de ser como acontece com o amor. Assim, as
pedrinhas do nosso quintal são sempre maiores do que as outras
pedras do mundo. Justo pelo motivo da intimidade."

Manoel de Barros,
em "Achadouros"

domingo, 1 de dezembro de 2013

PORTA



O estranho
bate:
na amplitude interior
não há resposta.

É o estranho (o irmão) que bate
mas nunca haverá
resposta:

muito além é o país
do acolhimento.


Orides Fontela,
in Poesia reunida.








E AS MÃOS...




E as mãos deles são, como as das mulheres,
afeitas a qualquer gesto de mãe:
álacres como os pássaros que aninham,
árdegos no se apressarem, tranquilos no confiarem,
simples ao toque como uma taça.

Rainer Maria Rilke,
in O Livro de Horas,
trad. de Geir Campos